19 fevereiro, 2010

Noite Mundana

Eles procuram felicidade instantânea. Eles procuram uma pílula. Não é que eu não use nenhum tipo de droga ou não me destrua por dentro, afinal, cigarro e álcool se enquadram nesse contexto. O diferente é, não preciso ser outra pessoa para passar bem o tempo e também não preciso ficar completamente embriagado para aproveitar uma boa música ou um bom dia. Eu me mato por prazer, não por fuga.

As batidas de uma música ruim machucam meus tímpanos, os atrozes dançam sem ao menos conseguirem controlar bem os movimentos. Sou um observador, não interfiro em nada. O escuro é parcial, vê-se a pista mas não o resto do salão, a fumaça do meu cigarro me conforta, o gole dourado e amargo me relaxa à medida que não me incomodo com os outros, apenas observo. Uma serva da luxúria me olha com um olhar diferente, ela é escrava de sua própria ambição de se mudar, ela é escrava das pílulas que tomou que a tornaram sedenta por seus prazeres mais obscuros.

Ela simplesmente vem em minha direção e me dá um beijo azedo. Minha língua amortece, me livro de sua companhia e saio do meu lugar seguro que era o sofá. Perto à janela me parece confortável, o ar puro da madrugada enche meus pulmões e repele a fumaça que estava retida no mesmo lugar. Tusso rapidamente para voltar às minhas observações. Meus amigos também se entregaram ao charme do proibido, à loucura da perda dos sentidos, à repulsa de si mesmos.

Mais um gole e o copo se esvazia, já é hora de parar, não quero me juntar à esse bando de corvos esperando a morte. Chegou então a parte ruim da festa, a mistura química, alcoólica e mecânica dos corpos respondem de uma maneira lógica. O mal estar. Pessoas caindo, cabeças girando e entranhas se rebelando. Cantos se cobrem de um líquido de cheiro amargo, e a náusea acompanha os meus sentidos quanto a essas demonstrações insalubres.

Tenho que sair de qualquer maneira. Desvio das pessoas no caminho, passo pela porta de vidro, um saguão se abre na minha frente exibindo poltronas e cadeiras das quais apenas uma está ocupada. A beleza dela é tão evidente quanto seu deslocamento. O óbvio é que apesar de passar despercebido, também estou deslocado. Sozinho em companhia de dúzias de amigos. Sento-me ao lado e começo uma conversa sutil. Ana, olhos verdes, cabelos vermelhos e face chorosa.

O tempo não passa e um beijo acontece, o incômodo dela com o gosto do cigarro é óbvio e desconfortável para mim. Outros acontecem até que esteja percebido que ela não liga mais, a companhia que ela queria acabara de chegar, alguém para não deixá-la sozinha, alguém que a entendesse. “Mais uma alma corrompida por mim”, penso. Não bebe, não fuma e fora abandonada por suas amigas, súditas da química.

O ar já não enche meus pulmões, meu corpo já se encosta quase que completamente com o dela, os músculos se enrijecem à estimulação no pescoço, ao cheiro completo de seus cabelos. Fronteiras são rompidas, lugares alcançados, e o que um dia poderia se dizer como uma idéia de pureza foi esquecida pela necessidade de quebrar a solidão. De fato, outra foi corrompida, e talvez eu tenha até me purificado um pouco também.

A noite passa, o sol nasce e devo ir. Dou-lhe um beijo de despedida. Não pego telefone ou qualquer forma de contato, nossas necessidades foram saciadas, não há mais o que procurar dali. A direção é firme e constante, as ruas permanecem no lugar onde devem estar para mim, diferente do que acontece para os passageiros. Cada um em sua casa como deve ser até que me deparo com a minha.

A cama macia me chama para deitar. O lascivo me toma a cabeça com as lembranças da noite. O perder do fôlego, as carícias eróticas. “A noite não foi tão ruim ao fim das contas”, fecho os olhos. Sem sonho, sem nada.


Gabriel Vitor Tortejada

17 fevereiro, 2010

Teus olhos


Não sei que conforto procuro em teus olhos,
ou será o gosto dos lábios que fica na minha mente.
Sei das palavras que tanto fugi,
do medo de me jogar e a vontade de sentir.

Sentir algo que nunca antes,
Ver com olhos de outra pessoa o que sempre quis.
Meus olhos incertos procuram sempre os teus,
minha boca, a tua
e minha pele quer encostar na tua.

Não sei por quantos homônimos eu passei,
ou passarei.
Sei que estou perto de ti.
E o carpe diem contigo quero conquistar.

Não sei se é só físico,
ou puramente emocional,
se é matemático, químico, espiritual.
Jamais me senti assim, e é assim que eu quero estar.
I think I’m falling.

Gabriel Vitor Tortejada